domingo, 1 de fevereiro de 2009

O princípio era a água.

RECEITA: CALDO DE BATATAS

Não pratico jejum com a intenção de emagrecer. Reconheço, porém, que fico feliz com os quilinhos que evaporam ao longo dos sete dias de abstinência. O motivo também não é religioso apesar de achar oportuna e iluminada uma citação bíblica na qual tropecei há pouco. Mesmo considerando-a um tanto ingênua e estando, há décadas, longe de ensinamentos catequéticos, acato a necessidade de transcrevê-la aqui.

Para que tantas desculpas? Já não estou grande o suficiente para fazer as pazes com a Bíblia? E, se não for para encará-la como livro sagrado, pelo menos que se deixe um espaço para ela perto dos livros de culinária. Afinal os testamentos estão abarrotados de receitas clássicas. E não é preciso se converter para experimentá-las.

“Quando você jejuar, perfume a cabeça e lave o rosto, para que os homens não vejam que você está jejuando, mas somente seu Pai, que está escondido; e seu Pai, que vê o escondido, recompensará você.” Mt 6.18

Jejuar é fácil, mais fácil do que cozinhar e comer. Nesses dias deve-se ingerir somente líquidos e tentar se afastar de tudo o que não é imprescindível à sobrevivência como álcool, cigarro, inibidores de apetite. É preciso se manter distante das atividades do cotidiano e, como você não está tirando uma folga, tv e muito telefone são considerados tabus. No lugar de se irritar com o externo, buscar relacionar-se consigo mesmo, comportando-se naturalmente, isto é, fazendo bem ao corpo e proporcionando-lhe o que ele exigir – durma até mais tarde, leia, caminhe, nade ou até dance. Sem comida, o corpo se alimenta do que é bom e se livra das impurezas. Por mais estranho e incrível que possa parecer, depois de cinco dias sem comer, o corpo ainda elimina detritos. Banhos longos e sauna ajudam a desintoxicar a pele.

Entretanto jejuar não é uma decisão que se faz do dia para a noite. Estipulo datas, desmarco compromissos e aviso os amigos que vou me afastar por uns tempos. Isso tudo sem alardeio pois são poucas as pessoas que entendem o motivo da privação espontânea da comida. Aí o tempo pára para mim. Sou eu e meu corpo. Depois de dois dias bebendo muita água, chás e apenas o caldo de legumes, a mente se abre e se ilumina de ideias. Compreende-se melhor o passado, que fica livre de seus aspectos nostálgicos, tem-se o pé no presente e vislumbra-se, sem expectativas, o futuro.

Não fazer nada, já dizia Hipócrates, é um bom remédio. Os dias de jejum, no entanto, são sempre extremamente ativos. E não há como ser indiferente quando o próprio corpo implora pela renovação. Meus armários mudam de lugar, os livros ganham nova ordem e a aparentemente imaleável agenda é fácil-fácil reestruturada. Desentulhar é a lei da hora.

E como intento, sim, fazer deste um blog culinário, transcrevo abaixo uma receita de caldo de batatas que, mesmo não sendo estrela de menu chique, ainda assim pode aquecer seu estômago em uma noite de inverno ou aliviar a consciência pesada no dia seguinte a um jantar orgiástico. Seja bem-vindo.

Caldo de batatas
Adaptada do livro Wie neugeboren durch Fasten – Dr. Med Hellmut Lützner


Ingredientes para 4 porções:

· 250 g de batatas
· 2 cenouras
· ½ alho-pró
· ½ colher de sobremesa de cominho
· 1 pitada de sal
· caldo orgânico de legumes
· 1 pitada de noz moscada
· 4 colheres de sobremesa de salsinha picada

Modo de preparo:


1. Lavar, descascar e cortar os legumes em pequenos pedaços.
2. Levar um litro de água para ferver. Cozinhar todos os ingredientes por 20 minutos, exceto a noz-moscada e a salsinha.
3. Passar o caldo pela peneira, pressionando os legumes com uma colher de pau. Salpicar com os temperos restantes.

3 comentários:

Juliana Vermelho Martins disse...

Adorei a história de fazer as pazes com a Bíblia. É isso mesmo! e se não for pra culinária, que seja pela literatura mesmo. As histórias são ótimas!

Quanto ao jejum, um dia chego lá. Por enquanto uma desintoxicação de 3 dias só no suco já me deixaria bem feliz.

Parabéns pelo blog. Cozinhar é uma paixão! Ele vai estar na lista dos meus preferidos.

Ana Elisa Granziera disse...

Adoraria conseguir jejuar. Vira e mexe meu marido jejua. Para ele parece mais fácil. Eu, depois de 5 ou 6 horas, fico com uma dor de cabeça atroz e um mal humor do cão. Difícil mesmo é conseguir ficar quieta e em paz. Para isso eu medito. E cozinho. Pelo menos nesses momentos o mundo não existe. Admiro você por conseguir!
:)

Abraços!

Isâni Guimarães disse...

Olá Bigode de chocolate,
Cheguei aqui pelo La Cucinetta e... gostei muito!
Achei interessante a sua posição sobre o jejum. Até por razões energéticas ele pode ser recomendado. Alimento é energia e recebe influências energéticas do ambiente, de quem o digere e de quem o manipula também. Podemos até não perceber mas, durante o jejum, ocorre não só a desintoxicação física como também a energética.
Parabéns pelo blog, volto me breve.
Isa