Após minha dieta restrita, começo a nova fase com um desejum leve, afinal não posso botar a perder toda a dedicação dos últimos dias. Quem resolve comer um boi logo após o jejum, tem que deixar o carro no estacionamento da churrascaria e voar para o hospital, onde verificará por outras vias o que abstinência alimentar significa. Eu quebrarei meu jejum com um pedacinho de pão.
Minha fome é outra. Tenho saudade é dos sabores. Privar-se do alimento é ficar longe de sensações básicas como a doçura, para enfrentar a realidade, às vezes, amarga, do próprio gosto. Não sou ninguém sem os gostos e aromas que experimento pois é assim que reconheço muito do mundo a minha volta. A idéia fantasiosa de que poderia algum dia perder o sentido gustativo, só me faz ficar mais atento a todas as nuances que possam existir entre os sabores doce, salgado, azedo e amargo que reconhecemos, além também de valorizar outros aspectos da comida, como sua textura ou temperatura. É sobre essa experiência sensorial que pretendo discutir por aqui.
Mas agora quero sentir o grude de farinha e água entre os dedos e sovar a massa, testando sua elasticidade. Quero, mesmo com todo o esclarecimento científico, vislumbrar o milagre da fermentação e imaginar o ar morno que luta tentando romper a membrana abaulada. Quero voltar flutuando para a cozinha, conduzido pelo aroma adocicado que incha minhas narinas. Quero romper com todos os princípios e sem pena e sem piedade serrar a casca do pão quente e, enfim, com meu rosto umedecido de vapor, com meus olhos fechados para a surpresa, deixar, agora sim!, a boca se encher de água e de felicidade.
Li que os hebreus parecem ter sido os primeiros a produzir o que hoje entendemos como pão – a mistura levedada de água e farinha. Havia um pão sem fermento chamado ázimo, considerado um pão ritual. O pão que irá interromper meu jejum é na sua forma parecido com o pão ritual dos hebreus e que ainda hoje simboliza restrição à fartura. Eu como essa minha versão do pão ritual para finalmente profanar a restrição aos sabores. Eu mordo a minha torrada e dou boas-vindas à gula.
Torradas Finlandesas (Finnisches Knäckebrot)
Adaptado do livro Das grosse Teubner Backbuch
Ingredientes para 20 torradas:
· 150 g de farinha de centeio
· 150 g de farinha de trigo para pães
· 150 g de farinha de centeio integral
· 50 g de varelo de aveia ou trigo
· 1 colher de sobremesa de fermento químico
· 1 ½ de sobremesa rasa de sal
· 1 colher de sopa de açúcar
· 1 colher de sobremesa de sementes de anis trituradas
· 70 g de manteiga derretida
· 150 ml de leite morno
· aproximadamente 250 ml de água morna
· farinha de trigo e farelo para abrir a massa
Modo de preparo:
1. Misturar todos os ingredientes secos em uma bacia. Adicionar o restante dos ingredientes e amassar bem até obter uma massa lisa. Cobrir e deixar descansar por uma hora.
2. Aquecer o forno à temperatura média e salpicar as formas com o farelo. Formar 20 bolinhas. Sobre uma mistura de trigo e farelo abrir a massa até obter círculos de 10 cm de diâmetro. Perfurar cada círculo várias vezes com o garfo e colocar nas formas.
3. Assar aproximadamente 15 minutos ou até dourar. Desligar o forno e deixar as torradas até que sequem.
Dica: Caso não haja lugar no forno para assar tudo de uma vez, asse em etapas. Depois de assadas, distribua as torradas em uma forma e deixe secar tudo de uma vez. Se o forno esfriar e você achar que as torradas ainda não secaram, é só aquecer o forno de novo. Em recipiente fechado, as torradas permanecem crocantes por mais de duas semanas.
Um comentário:
Me senti o fermento dentro do pão!
A foto é maravilhosa!
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